Você já parou para pensar como a escolha da fonte pode impactar diretamente a maneira como enxergamos uma marca? A tipografia pode afetar significativamente a legibilidade e a aparência geral de um projeto gráfico. Trata-se de uma poderosa ferramenta de comunicação visual, capaz de transmitir mensagens sutis e despertar diferentes emoções. Desde banners até fachadas, cada aplicação requer uma abordagem única.

Para entender melhor esse universo, falamos com Érico Lebedenco, type designer, designer gráfico e diretor de arte com experiência em estúdios de design, agências de publicidade e empresas de branding. Ele é especialista em tipografia, mestre em design, além de co-criador e apresentador do DiaCríticovideocast sobre design, focado em assuntos relacionados à tipografia.

Confira a entrevista e saiba tudo sobre família tipográfica

Primeiro, o que é uma família tipográfica?

Tradicionalmente, uma família tipográfica é formada por uma série hierárquica de tipos romanos e itálicos em diferentes pesos. A combinação de tipos romano, itálico, negrito e negrito itálico é a mais conhecida, mas uma família tipográfica pode ser maior que isso. Em geral, as variações de tipos em uma família costumam apresentar estruturas, proporções ou elementos formais similares, o que favorece a percepção de unidade ao conjunto. Contudo, o atual conceito de família tipográfica é muito mais amplo, por vezes incluindo tipos de estilos ou características visuais distintas, mas que se complementam de alguma forma no sistema proposto pelo type designer. Alguns desses tipos podem nem mesmo ser alfabéticos, como os dingbats.

Mas qual a diferença entre as fontes padrões já disponíveis no computador e as que precisam ser adquiridas?

Aquilo que conhecemos como “fontes de sistema” são as fontes digitais disponíveis diretamente pelos sistemas operacionais instalados nos computadores. Como a Arial, a Times New Roman, a Calibri, a Verdana e tantas outras. Acontece que, por mais que as empresas de softwares ofereçam uma quantidade razoável de fontes aos usuários, as opções acabam por se tornarem limitadas e repetitivas, porque todos têm acesso aos mesmos tipos. 

E como outras fontes podem ser encontradas?

Designers, diretores de arte e outros profissionais podem adquirir licenças de uso de novas fontes, produzidas por profissionais (type designers) independentes ou de empresas especializadas. As licenças desktop, webfonts, para servidores, e outras, estão disponíveis muitas vezes nos sites dos próprios profissionais ou em plataformas on-line para distribuição de fontes digitais. As licenças pagas podem ser adquiridas de modo bem simples, por meio de um cadastro e pagamento com cartão de crédito ou algum outro sistema; como qualquer outra compra on-line. MyFonts e Creative Market são algumas opções de distribuição daquilo que conhecemos como “fontes de varejo”. Existem algumas empresas brasileiras que produzem e distribuem diretamente suas próprias fontes, por exemplo Plau, Fabio Haag Type e Blackletra. Quem tem a assinatura do Creative Cloud, da Adobe, pode usar as fontes da Adobe Fonts em sincronia com a sua própria máquina – a assinatura já engloba este serviço.

Existem fontes gratuitas? Quais cuidados devem ser tomados?

Opções de licenças gratuitas também podem ser obtidas diretamente com as foundries mas são encontradas, principalmente, em plataformas de distribuição gratuita como o Google Fonts ou o Fontsquirrel. Contudo, valem alguns cuidados ao acessar sites gratuitos, como observar se as fontes apresentam todos os caracteres necessários no projeto, se a licença disponível permite o uso profissional ou não, e se é necessário a atribuição de autoria em alguma parte do trabalho executado com ela. 

família tipográfica

Por que acha importante ter variações tipográficas?  

Eu entendo as fontes digitais como recursos técnicos e de expressão visual para o trabalho do designer. Se as opções são limitadas, se restringem as soluções e possibilidades de uso. Obter novas fontes permite um aumento do repertório gráfico que pode ser utilizado pelo profissional, proporciona uma maior adequação conceitual da tipografia aos projetos e agrega valor ao se evitar a identificação de tipos desgastados pelo uso repetitivo.

Para evitar esse desgate, há sempre novas fontes disponíveis?

Eu acredito que sempre haverá espaço para novas fontes. Poderemos ter as nossas preferências; aqueles tipos que conhecemos todos os detalhes e que voltamos a usar de tempos em tempos. Entretanto, um mesmo tipo não pode solucionar todas as necessidades que encontraremos ao longo da carreira. Assim, são muitas as motivações para se criar novas fontes. Um designer de tipos pode trabalhar na criação de um tipo ou família tipográfica por estratégias mercadológicas, para atender necessidades técnicas de reprodução, para propor novas soluções em determinadas áreas de comunicação visual, também pode expressar aspectos culturais ou, até mesmo, ser resultado de um interesse pessoal do profissional. A cada fonte nova no mundo, surge uma nova possibilidade criativa.

Como a tipografia impacta na percepção e compreensão de uma marca?

Uma marca é composta por diversos signos, dentre eles a tipografia. Se considerarmos um logotipo, a representação visual dessa marca é a própria relação entre as formas alfabéticas que compõem o seu nome. Essas formas carregam em si toda a personalidade e expressividade dessa marca. Curvas, retas, alinhamentos, proporções, pesos, espaços internos e externos… tudo isso comunica ao observador os valores, ideias e conceitos impregnados na marca. Isto está além do seu conteúdo textual, do significado dicionarizado da palavra. Por isso, escolher o tipo ou produzir um lettering para uma marca é tão importante. Em geral, se deseja uma coerência entre a representação visual da marca (aquilo que ela se parece) com o seu significado ou conceito (aquilo que ela é).

Poderia explicar um pouquinho sobre a psicologia das fontes e quais sensações elas podem passar?

Assim como outros recursos de linguagem visual, as formas associadas aos tipos podem transmitir sensações ou produzir determinadas interpretações dentro do contexto de uso. O que torna isso interessante é reconhecer os aspectos culturais e simbólicos que podem ser explorados na comunicação. Por exemplo, formas arredondadas e abertas tendem a ser vistas de modo mais amigável, informal ou até infantil. Por outro lado, formas mais geométricas e modulares costumam trazer em si uma ideia de racionalização e rigidez. A própria história da tipografia na sociedade e suas classificações tipográficas podem ser utilizadas deste modo. Alguns tipos serifados carregam uma tradição muito longa de uso, uma constância que chega a remeter ao Renascimento, por exemplo. Há uma seriedade e até uma certa reverência nesses casos. Estilos caligráficos podem transmitir diferentes ideias ou até mesmo nos lembrar de aplicações populares (como os convites para casamento ou festas de 15 anos). Todavia, um estilo manuscrito irregular, com variações de formas, falhas e texturas, pode estar associado ao improviso ou uma escrita pessoal. Enfim, são muitas possibilidades. O problema de escolher um tipo que não é apropriado ao trabalho é que pode-se provocar visualmente uma interpretação diferente da desejada. Criando uma confusão de ideias ou até mesmo uma sensação de repulsa. Algo “divertido” escrito em Adobe Garamond pode não parecer tão legal assim para o leitor. Ou uma fonte grunge, com falhas e texturas, pode ser “rebelde” demais para uma comunicação corporativa. 

Como escolher, então, a tipografia para cada tipo de projeto? Quais tipos de tipografia mais indicados para cada finalidade?

Resumindo bastante: o ponto de partida é basicamente saber o que está sendo projetado, quais são as características ou limitações e para quem estamos criando isso. Como todo trabalho de design, se começa com um briefing. Com as informações do trabalho em questão, se fazem pesquisas e coletas de dados relevantes para a definição de critérios para a escolha dos tipos. Qual é o suporte a ser trabalhado? Existe algum diferencial? Qual é o conteúdo e para quem é direcionado? Existem restrições técnicas ou financeiras? Referências visuais podem ser organizadas para avaliar similares, identificar conceitos e estratégias gráficas de design úteis ao projeto. De acordo com o contexto, se define o nível de importância para alguns critérios. Legibilidade, recursos da fonte, aspectos culturais, expressividade, qualidade técnica e adequação, e por fim, as limitações financeiras e de licenciamento. Com a pré-seleção dos tipos, se realizam alguns testes de uso e aplicações em layouts com as opções mais promissoras. Quando se trabalha com critérios bem definidos, fica fácil reconhecer quais são os tipos mais apropriados, sem cair em achismos ou fórmulas repetitivas. 

E agora, deu para entender a importância das famílias tipográficas? A escolha da fonte certa é um aspecto crucial no desenvolvimento de uma marca e de qualquer projeto gráfico. Elas possuem características únicas que podem transmitir diferentes mensagens e emoções ao público-alvo. Ao escolher as fontes adequadas, garantimos que a mensagem seja transmitida de forma clara, consistente e profissional. Portanto, invista tempo e esforço na escolha das fontes corretas e colha os benefícios de uma marca forte e memorável.